Controle, flagrante e prazer: Regimes escópicos e atencionais da vigilância nas cidades
This paper examines scopic and attentional regimes that are present in surveillance systems and practices in contemporary cities. I intend to show that such regimes involve not only control procedures, but also pleasure circuits, updating the interplay between surveillance and spectacle in contemporary culture. Three fields of research will be prioritized: the incorporation of video surveillance in public and semi-public spaces, the production and distribution of amateur images, and the cartographic information systems of visualization of urban space.
O artigo analisa regimes escópicos e atencionais presentes em dispositivos e práticas de vigilância nas cidades contemporâneas. Pretende-se mostrar como tais regimes envolvem não apenas procedimentos de controle, mas também circuitos de prazer, atualizando as relações entre vigilância e espetáculo na cultura contemporânea. Nesta mistura de controle e prazer, destacam-se uma lógica e uma estética do flagrante, presentes no olhar e na atenção vigilantes sobre a cidade e os indivíduos que nela circulam. Três campos de análise serão privilegiados: a incorporação da videovigilância aos espaços públicos e semipúblicos, a produção e difusão de imagens amadoras e os sistemas informacionais e cartográficos de visualização do espaço urbano.
Uma brevíssima e seguramente incompleta apresentação da paisagem atual da vigilância urbana nos servirá de preâmbulo à análise dos processos aqui em foco. A paisagem é extremamente múltipla e complexa não apenas por conta da miríade de dispositivos de vigilância espalhados pelas cidades, mas também pela multiplicidade de funções, propósitos e afetos que os atravessam. Comecemos pelos dispositivos: câmeras de vigilância em lugares públicos, semipúblicos e privados, webcams pessoais ou institucionais, sistemas de controle de trânsito (câmeras, pardais, radares), sistemas de geolocalização (GPS5, GIS6, RFID7), fronteiras e portões eletrônicos (senhas e cartões de acesso, scanners para pessoas e bens/produtos), mecanismos de autenticação e controle de identidade (cartões de identidade e dispositivos de identificação biométrica), tecnologias de informação e comunicação (computadores, telefones celulares), redes de monitoramento e cruzamento de dados informacionais, sistemas informacionais de coleta, arquivo, análise e mineração de dados (bancos de dados, perfis computacionais), entre outros. Alguns destes dispositivos tendem a funcionar conjuntamente, refletindo, no campo da vigilância, uma tendência à “convergência tecnológica” presente em
outros setores, como o das telecomunicações. A combinação de sistemas de videovigilância, bancos de dados, identificação biométrica e tecnologias de monitoramento, por exemplo, é cada vez mais comum e o uso de sistemas “inteligentes” interconectados tende a ser utilizado para
monitorar movimentos e comportamentos de milhões de pessoas no espaço e no tempo. Além disso, nota-se que nem todos estes dispositivos estão direta ou intencionalmente voltados para o exercício da vigilância; esta, em muitos casos, é efeito ou característica secundária de um
dispositivo cuja função primeira é outra – um telefone celular com câmera, por exemplo, tem uma função primeira de comunicação e registro visual, mas pode ser apropriado como uma câmera de vigilância em certas ocasiões, tal como aconteceu no caso do enforcamento de Sadam Hussein, no atentado a bomba no metrô de Londres, entre muitos outros casos.